terça-feira, 3 de agosto de 2010

Os Irmãos Penitentes

a43 Frei Almir Ribeiro Guimarães, OFM

  “Agora, porém, depois que abandona¬mos o mundo, nada mais temos a fazer, a não ser seguir a vontade do Senhor e agradar-lhe” (Regra não bulada 22, 9).
    1. Estamos diante de mais uma exortação importante extraída das prescrições da Regra não bulada de São Francisco. As poucas linhas aqui transcritas abordam o tema da mudança de coração, ou seja, da conversão. Francisco serve-se da expressão abandonar o mundo, quer dizer, deixar um jeito de viver que não está de acordo com a vontade de Deus e não leva em conta os apelos do Evangelho. Os que se convertem nada mais têm a fazer do que agradar a Deus.

    2. Os irmãos de Francisco são penitentes. Eram conhecidos, com efeito, como os penitentes de Assis. A Regra da OFS afirma: “Como irmãos e irmãs da penitência, em virtude de sua vocação, impulsionados pela dinâmica do Evangelho, conforme o seu modo de pensar e de agir ao de Cristo, mediante uma radical transformação interior que o próprio Evangelho designa pelo nome de conversão, a qual, devido à fragilidade humana, deve ser realiza¬da todos os dias” (n.7).

    3. O movimento franciscano nasce num contexto particular da vida da Igreja na Idade Média. Na Itália, França e Bélgica, principalmente, surgem iniciativas de reforma e de renovação dos costumes. No seio de uma Igreja carente de vigor e de viço, grupamentos masculinos e femininos desejam voltar ao Evangelho. Francisco, o penitente de Assis, se insere nessa busca de espiritualidade evangélica. No fundo trata-se de se empreender um processo de conversão. Conversão quer dizer mudança do coração. Conversão evangélica significa voltar ao Evangelho. Muitos desses movimentos reformadores desembocaram na heresia. Este não foi o caso de Francisco que ficou fiel à Igreja. Renovou-a a partir de sua própria renovação.

    4. Para que alguém possa ingressar no Reino de Deus ou merecer herdá-lo é a conversão associada a uma busca do Evangelho, diria mesmo, por uma paixão pelo Evangelho. Vida de conversão é a daquele que se conforma à Cristo e aos pedidos e às exigências do Evangelho. Os que entram num processo de conversão vivem. Morrem os que rejeitam uma vida de penitência. No mesmo número da Regra não bulada. Francisco desdobra o tema da conversão: necessidade de ouvir a palavra com um coração acolhedor, deixar os mortos enterrarem os mortos, conservar a casa do coração limpa.

    5. A conversão requer abandono de um certo modo de viver interesseiro, egoísta, materialista. A pessoa se volta alegre para o Evangelho e para Cristo Jesus e começa matar o seu próprio ego e abrir-se a Deus e ao próximo. Francisco, aliás, lembra no seu Testamento que deixou o mundo quando se encontrou com o leproso e o beijou. Naquele momento o doce se tornou amargo e o amargo, doce. A conversão é uma vitória sobre si mesmo. Entra num processo de conversão aquele que toma a decisão de agir segundo o Espírito e não segundo a carne, como escreve Paulo na Carta aos Gálatas (cap.5).

    São Boaventura lembra: “E assim, num determinado dia, enquanto cavalgava pela planície que se estende aos pés de Assis, (Francisco) encontrou um leproso, cujo inesperado encontro lhe incutiu não pequeno horror. Lembrando-se, porém, do propósito da perfeição já concebida na mente e recordando-se de que primeiro deveria vencer-se a si mesmo, se quisesse tornar-se cavaleiro de Cristo, saltando do cavalo, correu a beijá-lo” (Legenda Maior 1,5). Francisco converteu-se ao irmão das chagas purulentas que tanta repugnância lhe causava. Lá estava Cristo e o Evangelho!

    6. O caminho da conversão é árduo. Os que querem seguir o Evangelho passam por uma porta estreita. A conversão evangélica poderia se caracterizar pela prática da oração, do jejum e da esmola. Assim ela se exprime no tocante a Deus. No que tange aos irmãos a vida de penitência se marcaria pela bondade como imitação da bondade do Pai dos céus. Uma vida de penitência ou de conversão se manifesta no culto a ser prestado a Deus e no serviço dedicado e fiel à Igreja. Os irmãos seculares servem a Deus dedicando-se a obras de caridade e pro¬movendo em todos os lugares a justiça e a paz.

    7. A Regra da OFS lembra que os irmãos são impulsionados pelo dinamismo do Evangelho. Haverão de conformar seu modo de pensar e de agir ao de Cristo. Isto quer dizer: agir com benevolência, saber perdoar, procurar os mais abandonados, visar aos interesses dos outros, chorar com os que choram e rejubilar-se com os que se alegram, retribuir a Deus o que é de Deus. Conversão é, pois, achegar-se mais a Deus, perscrutar sua vontade, colocá-la em prática e buscar os outros.

    8. As Fraternidades Franciscanas Seculares são escolas e es¬paços de encontro de irmãos que estão em franco caminho de conversão: juntos louvam a Deus, juntos se ajudam, juntos fazem um balanço de suas vidas, juntos empreendem tarefas que concretizam os desejos e exigências do Evangelho, juntos lavam os pés dos outros.

    9. Falar em conversão é lembrar que somos chamados à santidade, a sermos santos,  como santo é o Pai dos céus. Os franciscanos são irmãos penitentes.

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