quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Procurar com Francisco e Clara


Iniciámos o dia com o Salmo 41:
“Como suspira o veado (corça) pelas correntes das águas, assim minha alma suspira por vós, Senhor” … “Dia e noite as lágrimas são o meu pão” … “Onde está o teu Deus”?
Este é um salmo que se nos apresenta como o desabafo e o sentir da alma desolada, triste, traída e em busca de Deus, com sede de Deus. Ao longo deste desabafo encontramos duas vezes este verso: “Porque estás triste minha alma, e desfaleces? Espera em Deus, ainda O hei-de louvar, meu Salvador e meu Deus”.
ESPERAR EM DEUS, mesmo que tudo à minha volta teime em fazer-me a pergunta “onde está o teu Deus” para que sofras tanto, para que te sintas tão abandonada, para que te sintas traída, ó alma sedenta do Deus que parece estar distante?
Onde está o teu Deus?
O nosso Deus não é um Deus ausente mas muito presente. Urge esperar as esperas de Deus que não são do nosso tempo mas no tempo certo de Deus.
No Hino cantado também esta manhã nós cantávamos o dia novo que amanhece, quem espera e desespera, a sempre nova primavera, quem do mal se ergue e levanta, canto quanto hoje Deus me der… alguns dos versos cantados na Oração matinal.
O amanhecer da nossa vida que cantamos não é o do passado nem o do futuro, é o hoje da nossa história com Deus e de Deus connosco.
Podemos então à luz deste canto reconhecer que na verdade Deus é o mar em que os místicos se movem.
Voltemos a Lc. 12, 22-32: “procurai o Reino de Deus”.
Perguntemo-nos sobre o que nos preocupa e o que nos ocupa realmente?
Face à nossa inquietude Cristo apenas lança um convite e ao mesmo tempo um desafio: “Não vos preocupeis com o amanhã, o Pai cuida… vinde, aproximai-vos de mim…”.
Quais as grandes questões da vida que coloco no meu caminho? Talvez o que o que agita e preocupa a nossa vida sejam simplesmente as emoções do coração que trazem tristeza, amargura, morte, alegria, exultação… sem dúvida que a nossa vida tem que estar repleta destas questões do coração. É por isso que cada vez mais os cardiologistas têm mais e mais clientes, porque os corações estão inquietos com tanta coisa e não conseguem gerir com serenidade e maturidade tais sentimentos.
A Ir. Amélia levanta então uma questão pertinente: “Que tal uma consulta ao nosso cardiologista (JESUS) para ver como está o nosso coração e os nossos sentimentos e emoções face a Ele? Urge fazer um silêncio bom de escuta, abrir-lE o nosso coração plenamente, auscultá-lo bem para ver como o sentimos bater”. O retirar-se do buliço pode ser um tempo de graça para fazer este exame médico da espiritualidade, acrescento eu.
Colocar questões a nós mesmos implica ESCUTAR respostas (de Cristo), para nos encontrar-mos com maturidade a nós mesmos e pelo nosso próprio pé, livremente e sem bengalas…
Lucas repete: “Eis que vos digo: (ESCUTAI) não vos preocupeis… com o que comer ou vestir… não acrescentareis mais à vida por isso … valeis mais que todas as coisas… o Pai cuida de vós, ACREDITAI!”
Tudo o que me preocupa e que não é essencial é resto, é secundário e o resto é para jogar para o lixo. Não devemos deixar que estes restos nos atormentem, parafraseando a palavra de Cristo, os pagãos procuram isso sem descanso. Vós porém, o Pai sabe do que precisais, não sejais como os que se lamentam em pedinchices de imaturidade espiritual.
“PROCURAI antes o Reino de Deus – continua – e tudo o resto vos será dado. Não temas, pequeno rebanho, porque agradou ao Pai dar-vos o Reino”.
Qual Reino? Perguntamos tantas vezes. Onde está? Este Reino não é algo distante, ele já está entre nós, é Jesus e o Seu Corpo que é a Igreja, é o Espírito do Pai actuante em nós e por nós. Não se trata de uma realidade para depois da morte, é o Reino anunciado presente 122 vezes nos Evangelhos sendo 90 vezes da boca de Jesus. Ele o repete tantas vezes para reforçar a certeza de que não é algo que está para vir mas sim uma realidade já presente no meio de nós.
O reino de Deus é uma revolução absoluta e urgente no mundo hodierno, neste dia como no dia de Francisco e Clara de Assis.
Para Francisco, este “certo dia” é um momento sagrado que o leva a afirmar “é isto que eu quero, é isto que eu anseio com todas as veras da minha alma” (Testamento, n.º 14). Francisco descobre que o que procurava estava mesmo ali, seguir Cristo sem medida respondendo ao convite do Evangelho. Por isso continua a afirmar que: “depois que o Senhor me deu irmão, ninguém mais me dizia o que eu devia fazer mas o mesmo Altíssimo me revelou que devia viver segundo o Evangelho…”.
Francisco vive aqui um momento sagrado de clareza invulgar, experiência religiosa e humana, surpreendido como Bernardo e Pedro que exultam de alegria ao encontrar-se com o Senhor e a Sua vontade.
Para o Religioso, o próprio Deus se revela deixando ver as suas maravilhas, os seus actos, os seus gestos, o seu Amor. Francisco compreende este sagrado instante da sua vida como momento de revelação naquele “certo dia, em certa igrejinha, com certo Evangelho…”
Este acontecimento fulcral na sua vida desafia-nos a nós hoje a REVIVER O SONHO DE FRANCISCO E CLARA NO CHÃO DA VIDA… na medida em que este “certo dia” guarda o momento fundador e fundante da nossa Vida Franciscana. Somos prova disso, aproximamo-nos cada vez mais do chão sagrado, onde devemos descalçar as sandálias (peregrino), e de pés descalços experienciar a leveza do dom de Deus e do Seu reino.
Reviver ou recordar é fazer comemoração. As grandes memórias celebram-se na nossa sociedade com grandes comemorações e festas que proliferam a propósito e despropósito. Cada vez mais se faz uma festa ou comemoração por tudo e por nada. Até nós, os Religiosos, já nos vamos tornando peritos de tais festas e comemorações, quiçá à luz do mundo, para esquecer o concreto e o cerne que deve motivar o nosso viver quotidiano. É importante comemorar, claro que sim, a festa e a alegria é uma característica do Cristão e do Franciscano mas só na medida em que se prolonga na vida, deixar que a festa fique num rosto a contemplar apaixonadamente porque acontecimentos sagrados são absolutos e eternos, vivem o presente cada vez com mais entusiasmo e projectam o futuro com mais audácia.
Urge perguntar: Será que nos reconhecemos ao olhar o espelho da vocação e da vida de Francisco e Clara? Ter-se-ão apagado em nós os seus sonhos e o nosso sonho?
A vida de Francisco e Clara foi um sonhar permanente, pois só quem sonha tem a capacidade de transformar a realidade da vida e não ficar aquietados à espera dos outros que não sonham. Francisco sonhou, escutou Deus e partiu em missão e os outros vieram ao seu encontro.
Há uma distância entre o sonho de Francisco e o nosso sonho. É importante tomarmos consciência disto porque o Carisma sonhado por Francisco e Clara está longe de esgotar as suas possibilidades. Há muito para fazer com ousadia, coragem e esperança porque este carisma fala alto ao Homem de hoje pela afinidade que este tem para connosco, filhos e filhas do Poverello, pelo contraste e desconcerto que um tal carisma pode provocar (positivamente) no mundo actual que vive muito do edonismo, do egocentrismo ao qual respondemos com a nossa vida fraterna, o nosso ser Irmãos. As bandeiras do nosso agir actual devem ser as da solidariedade como expressão própria da Menoridade (Irmãos Menores), da paz, da ecologia, da justiça, da sobriedade, do diálogo ecuménico das relações humanas e fraternas.
A hora actual não é só desgraça mas é HORA DE GRAÇA. Temos que ousar abrir os olhos, romper horizontes para encontrar portos de saída para as diversas situações que se nos deparam a cada momento. “Devemos, como nos recorda a Sagrada Escritura, permanecer em trajes de trabalho”, não cruzar os braços como se tudo já estivesse acabado ou como se já nada tivesse solução.
Fonte:http://betus-pax2.blogspot.com/search?updated-max=2010-09-15T00%3A20%3A00%2B01%3A00&max-results=100

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