terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

Laicato maduro e significativo para novos tempos Parte– 1

Por Frei Almir R. Guimarães, OFM

A Ordem Franciscana Secular é a mais antiga forma de organização de leigos que, guiados pela Igreja, unidos em fraternidade e inspirando-se no ideal de São Francisco de Assis, se empenham em testemunhar com a vida o Evangelho de Jesus Cristo e se dedicam ao apostolado no estado laical (Palavras de João Paulo II dirigidas aos franciscanos seculares).

Os franciscanos seculares encontram na Regra o projeto evangélico e o auxílio necessário para poderem se tornar efetivamente instrumentos da reconciliação universal operada por Cristo. Tal projeto franciscano supõe a colaboração com a ação de Deus no interior das estruturas humanas. A expressão “no interior” é de fundamental importância porque afirma que a santidade, a “perfeição da caridade” que os franciscanos seculares são chamados a realizar, não passa “acima” de sua condição humana, tanto individual como social, não se realiza “apesar” de viverem em família, de trabalharem, estudarem, lutarem por uma sociedade mais justa, pela justiça, pela paz…, mas – essa é a grande verdade que Francisco intuiu – tal santidade é alcançada precisamente pelo fato de viverem fiel e evangelicamente todas as situações próprias da condição secular (Manuale per l’assistenza all’OFS e alla GiFra, p. 89).

1. A Ordem Franciscana no Brasil tem refletido sobre muitos temas importantes que visam alimentar a vida dos irmãos e das irmãs. Nos últimos tempos temos estudado a questão do senso de pertença à Ordem, as características de nossa identidade, a ação concreta no mundo, a presença dos irmãos no mundo, o senso missionário, a revitalização de nossa vida fraterna e das reuniões gerais, o cuidado pelo criado. Duas questões parecem nos preocupar no momento: Como formar na OFS um laicato vigoroso e maduro? Que expressão têm os franciscanos seculares em nossas dioceses e no mundo?

2. Não há dúvidas. Os franciscanos da Terceira Ordem são seculares. Secular não quer dizer pessoa que adota o secularismo, ou seja, exclusão do mistério da Transcendência. Os terceiros vivem no mundo. Casam-se, trabalham, empenham-se por viver o Evangelho na sociedade dos emergentes, do neoliberalismo, do consumismo, da comunicação e da exclusão. Inquietam-se com tudo aquilo que, no mundo, é contra o espírito cristão, a espiritualidade franciscana e a Regra que professaram. Inquietando-se com isso, dão testemunho do contrário. São seres leves, alegres e transparentes.

3. Nas últimas décadas falamos sempre em Ordem Franciscana Secular. Insiste-se, portanto, no secular. Esse secular é para valer. Documentos exarados de Capítulos da Ordem em diferentes níveis nos últimos tempos insistem na presença dos irmãos no mundo. Na medida em que os candidatos à vida franciscana secular forem sendo formados no espírito da Regra, esperamos poder ter em nossas fileiras um laicato maduro e nossas fraternidades serão significativas, ou seja, irradiarão o Evangelho no meio das realidades terrestres.

4. Teoricamente estamos todos de acordo que a OFS seja caracterizada pela atuação no mundo. Uma coisa é a teoria e outra, a prática. Os membros da Ordem não são franciscanos “apesar” de serem casados, de terem filhos, de trabalharem na abertura das estradas ou na bolsa de valores. Estamos diante de leigos corajosos que implantam o Reino nas realidades terrestres e suas primeiras e fundamentais preocupações não podem ser as atividades litúrgicas e os serviços religiosos “ad intra”. Estão postados diante de um mundo cheio de desafios e têm a missão de torná-lo cristão. Haverão de se constituir numa laicato maduro e significativo para os novos tempos.

5. Vivemos tempos novos na Igreja e no mundo. Não nos cansamos de dizer isto. O mundo destes primeiros anos do novo milênio tem pouco a ver com a década de 40 ou 50 do século passado. Na Igreja e no mundo não podemos nos aferrar a posicionamentos que se tornaram obsoletos, anteriores a toda a uma série de reformas e atualizações (aggiornamento) da Igreja. O passado e a maneira de viver o cristianismo e o franciscanismo ficaram estreitos e não cabem mais em nós como uma roupa que ficou apertada. Não podemos nos enclausurar no passado e viver da nostalgia. Temos que olhar para frente e imaginar um amanhã conforme o desejo do Espírito. Estamos terminantemente proibidos de viver a vida cristã franciscana como mera repetição do passado. Seria faltar com a coragem de acolher a novidade do Espírito. A Regra que a Igreja nos deu aponta para tempos novos.

6. A Ordem Franciscana Secular, de modo especial pela “modernidade” de sua Regra, é constituída de homens e mulheres dos tempos novos. Algumas de nossas fraternidades ainda respiram os ares anteriores à promulgação da Regra e de sua assimilação. Estamos convencidos de que as fraternidades novas que vão surgindo serão grupos que darão substanciosa contribuição para tornar o mundo mais humano e a Igreja mais e mais sacramento, sinal do mundo novo. Imaginamos os franciscanos seculares leigos maduros e em franco processo de amadurecimento.

7. O tema de um laicato maduro se une ao de um grupo que tenha significação, que seja expressivo no atual contexto do mundo e da Igreja. Que visibilidade têm as fraternidades franciscanas seculares? Que influência têm os membros na Ordem nas paróquias, na dioceses e na vida da cidade? O simples fato da existência de uma fraternidade é levado em consideração, reconhecido, pelos membros de uma paróquia? Que influência exerce a OFS na Igreja do Brasil? Será que está desempenhando, nos diferentes níveis, um papel decisivo de reconstrução da Igreja no começo deste novo milênio? De que visibilidade gozamos? Leigos, bispos e sacerdotes esperam de nós colaboração na transformação da realidade e da Igreja? A OFS deverá ser constituída de um laicato maduro e expressivo.

8. Laicato – Não é aqui o lugar de fazer um tratado sobre esse tema vasto e complexo. Não pretendemos entrar em polêmicas. Documentos sérios e sólidos da Igreja tratam do assunto. Mencionamos aqui apenas dois deles: a Exortação Apostólica sobre a Vocação e a Missão dos Leigos de João Paulo II (Christifideles laici) e o Documento de Aparecida. Muitos outros deveriam ser mencionados. Os leigos são cristãos incorporados a Cristo pelo batismo. Formam com bispos, padres, diáconos, religiosos e religiosas o povo de Deus. Participam das funções de Cristo sacerdote, profeta e rei. No dizer do documento de Puebla são homens da Igreja no coração do mundo e homens do mundo no coração da Igreja. Sua missão própria se realiza precisamente no mundo e não nas atividades internas da Igreja mais vinculadas ao ministério dos pastores. Sua presença e sua ação visam transformar o mundo. Ajudam no nascimento de estruturas justas no meio do mundo.

9. Evangelii Nuntiandi: “A sua primeira e imediata tarefa (dos leigos) não é a instituição e o desenvolvimento da comunidade eclesial – esse é o papel específico dos Pastores – mas sim, de pôr em prática todas as possibilidades cristãs e evangélicas escondidas, mas já presentes e operantes nas coisas do mundo. O campo próprio de sua atividade evangelizadora é o mesmo mundo vasto e complicado da política, da realidade social e da economia, como também da cultura, das ciências e das artes, da vida internacional, dos meios de comunicação e, ainda, outras realidades abertas para a evangelização, como seja, o amor, a família, a educação das crianças e dos adolescentes, o trabalho profissional e o sofrimento (Evangelii Nuntiandi, n . 70).

10. Os leigos cristãos através de sua vida haverão de tornar crível a sua fé de modo especial através de uma conduta humana e cristã marcadas pela coerência. Serão chamados a participar na ação pastoral primeiro pelo testemunho de vida, pela atuação nos campos assinalados por Evangelii Nuntiandi e, segundo lugar, com ações no campo da evangelização da animação liturgia e orante das comunidades.

11. Não podemos deixar de mencionar, no contexto deste tema, uma das prioridades do apostolado evangelizador dos leigos: a ação evangelizadora da família. Novamente é Evangelii Nuntiandi que insiste. Fala da Igreja doméstica. A família, como a Igreja, tem por dever ser um espaço onde o Evangelho é transmitido e donde o Evangelho se irradia. Belamente assim se exprime o documento: “No seio de uma família que tem consciência desta missão, todos os membros da mesma família evangelizam e são evangelizados. Os pais não somente comunicam aos filhos o Evangelho, mas podem receber deles o mesmo Evangelho profundamente vivido” (n. 71).

12. Quando falamos da realidade e missão dos leigos não podemos deixar de mencionar a força das imagens do sal da terra, luz do mundo e fermento da massa. Christifideles Laici assim se exprime: “As imagens evangélicas do sal, da luz e do fermento embora se refiram indistintamente a todos os discípulos de Jesus, têm uma específica aplicação nos fiéis leigos. São imagens maravilhosamente significativas, porque falam, não só da inserção profunda e da participação plena do fiéis leigos na terra, no mundo, na comunidade humana, mas também e sobretudo, da novidade e da originalidade de uma inserção e de uma participação destinadas à difusão do Evangelho que salva” (n. 15).

13. Laicato maduro – Maduro é um termo que vem da botânica. Os frutos começam a aparecer depois da floração. Com o sol, a chuva, os cuidados do agricultor vão se desenvolvendo e chegam a ficar maduros. Trata-se de um processo que, caso por caso, demanda tempo. Podemos falar de um laicato maduro em muitos sentidos e desdobramentos que não podemos esmiuçar no limite desta reflexão. Trata-se de termos na Igreja e na Ordem uma plêiade de leigos e leigas em nítido processo de amadurecimento. Não há pessoas completamente maduras, mas em processo de amadurecimento. Para os cristãos, a verdadeira maturidade se chama santidade. Podemos falar de uma maturidade humana, afetiva, cristã, franciscana e missionária.
14. No frenesi das coisas e da pressa de nossos tempos, na aceleração de tudo notamos que as pessoas querem tudo muito rapidamente. Não dão tempo ao tempo e o processo de maturação. Imaginemos, caricaturalmente, uma situação. Um moço tem seus 15-16 anos. Estuda sem estudar de verdade. Tem pai e mãe, mas não é de fato envolvido por eles num processo de educação. Encontra-se com uma menina, vive um envolvimento amoroso, abandona essa, se casa com outra, faz faculdade, exerce a profissão, mas não visita seu interior. Casa-se e se separa. Passa a pagar pensão para o filho. Depois é convidado a frequentar uma dessas igrejas novas. Como é que esse moço pode crescer em maturidade? Nota-se que muitos se tornam maduros, desenvolvidos em partes de sua vida e não realizaram uma maturação global e integrada. São técnicos de informática mas não têm domínio algum sobre outros aspectos de sua personalidade. São infantis e imaturos. Não nos esquecemos que muitos desses podem ser membros de nossas fraternidades e eventualmente serem escolhidos para fazerem parte do Conselho. Não se compra maturidade nas gôndolas e prateleiras dos centros comerciais. T
Continua...

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