quarta-feira, 7 de novembro de 2012

Que expressão tem a OFS na Igreja e no mundo hoje?

Frei Almir Ribeiro Guimarães

Brilhe a vossa luz diante dos homens, para que vendo vossas boas  obras glorifiquem vosso Pai
que está nos céus  (
Mt  5, 16)

Os franciscanos seculares ajam  sempre  como fermento nos ambientes em que vivem, mediante o testemunho do amor fraterno e de claras motivações cristãs (Const. Gerais OFS, art 19,1)

Santa Angela de Foligno

1. Nós, cristãos,  não queremos “aparecer”  aos olhos dos outros. Não somos dados a  protagonismos, nem andamos à cata de aplausos e de reconhecimento. Fazemos nossa obrigação e saímos de cena. Essa atitude é típica também dos franciscanos. E, no entanto, somos convidados a agir e atuar no mundo,  temos todos a responsabilidade de levar adiante o projeto  de Jesus, projeto que ele nos confiou depois de ter voltado ao Pai. Tudo isso quer dizer  “visibilidade”,  “expressividade”. Não se coloca uma luz debaixo da mesa. O sal precisa salgar. O fermento necessita fermentar. Somos convidados a refletir sobre a expressão que tem a Ordem,  em seus três ramos,  em nossos tempos no coração da Igreja e na sociedade.  A OFS tem o costume de realizar capítulos avaliativos e, talvez,  nesse espaço de partilha e de revisão de vida, se poderia pensar em responder à pergunta-título desta reflexão.

Que visibilidade, que expressão  têm as Fraternidades Franciscanas  Seculares na Igreja e na sociedade de hoje? Como somos vistos pelos bispos em suas dioceses, pelos padres em suas paróquias, pelos leigos em geral e pelos nossos familiares? Nesse mundo em que vivemos, na cidade em que habitamos, que expressão tem a OFS? O que anda animando profundamente a nossa existência e que pode transparecer no cotidiano de nossas vidas,  iluminar os homens e restaurar a Igreja? Que influência exercemos na Igreja em que vivemos e, em nível nacional, que luz projeta no país o Conselho Nacional da OFS e toda a Fraternidade  nacional? Será que as pessoas nem sabem que ela existe? Como franciscanos seculares que fazem promessa de seguimento do Evangelho no mundo  não somos simplesmente responsáveis por fazer com que as coisas continuem, com que  a “máquina gire”.  Temos, com toda humildade e minorismo, alguma coisa a oferecer à Igreja e ao mundo, uma palavra a ser dita aos tempos de hoje.

2. Não é o caso aqui de se fazer um estudo exaustivo a respeito da visibilidade expressiva da Ordem Terceira de São Francisco. Há nomes que marcaram: Isabel da Hungria,  Ângela de Foligno,  Contardo Ferrini para mencionar apenas três.  Há gloriosas páginas escritas pelos irmãos e irmãs da Ordem ao longo dos séculos.  Todos nos lembramos das grandes fraternidades do Brasil. Naquele tempo, os irmãos e irmãs  usavam sinais, tinha hábito, participavam das procissões com seus distintivos.  Não estou aqui exprimindo desejo de voltem os hábitos, mas o certo é que as fraternidades eram mais visíveis.  Os tempos mudaram. A OFS foi objeto de profundas transformações e precisamente na medida em que as novas fraternidades forem assimilando as orientações da Regra e das Constituições vão ganhar nova visibilidade e  se “exprimirão” de outra forma.  Podemos dizer, logo de início, que a visibilidade da OFS depende de fraternidades locais bem formadas, de grupos que resolveram assumir como documento inspiracional de sua caminhada  a Regra paulina.  Uma parte das  razões de uma certa “inexpressividade” da OFS  têm sua origem na não assimilação do espírito da Regra que foi publicada em 1978.  Os irmãos e irmãos são conhecidos, ainda hoje,  como “piedosos cristãos devotos de São Francisco”, pessoas envelhecidas e “inofensivas”  e que  não têm muito a dar. Muitos acreditam que não temos amanhã. Nossos tempos, no entanto, quiseram,  dizemos de maneira talvez um pouco irreverente,  que os leigos saíssem das sacristias.  Por isso, quando queremos  refletir sobre a  visibilidade dos franciscanos leigos, hoje, desejamos que haja uma expressão  prioritária na linha do secular.

3. Desde que os responsáveis pela redação da  Regra, inspirados pelos  ensinamento do Vaticano II, terminaram o texto aprovado por Paulo VI, ficou claro que a OFS terá prioritariamente expressão em sua dimensão secular.  Christifideles Laici  insiste na expressão índole secular. “Efetivamente o  Concílio descreve a condição secular dos fiéis leigos indicando-a, antes de mais nada, como o lugar onde lhes é dirigida  a chamada de Deus:  Aí são chamados por Deus.  Trata-se de um lugar descrito em termos dinâmicos:  os fiéis leigos vivem no século, isto é, empenhados em toda e qualquer ocupação e atividade terrena e nas  condições ordinárias da vida familiar e social, com as quais é como que tecida a sua existência. Os fiéis leigos  são pessoas que vivem a vida normal no mundo, estudam, trabalham, estabelecem, relações amigáveis, sociais, profissionais, culturais” n.15).  Não se espera “expressividade”  da OFS  apenas em atividades litúrgicas e catequéticas.  O jeito de viver no mundo o Evangelho é que poderá mostrar que os franciscanos seculares  têm uma contribuição da dar à Igreja e à sociedade.  Não são assim tão “inofensivos”.

4. Muitas vezes já ouvimos que os cristãos são luz do mundo, sal da terra e fermento da massa. “As imagens evangélicas  do sal, da luz e do fermento embora se  refiram indistintamente  a todos os discípulos  de Jesus, têm uma específica aplicação nos fiéis leigos. São imagens maravilhosamente significativas, porque falam não só da inserção  profunda e da participação plena  dos fiéis leigos na terra, no mundo, na comunidade humana, mas também, e sobretudo, na novidade e na originalidade de uma inserção e de uma participação destinadas à difusão do evangelho que salva” ( n. 15).

5. Os franciscanos seculares,  em suas atitudes e posturas mais do que em palavras,  passarão a  convicção de que suas vidas são marcadas pela força do carisma de Francisco dado à Igreja.  Já trabalhamos, em anos anteriores, o tema da identidade. Foram dados passos largos na Ordem toda e, de modo especial, entre nós, numa melhor compreensão do senso de pertença. Necessário, sempre de novo, voltar à vocação inicial, ao primeiro amor,  ao momento em que resolvemos  ouvir o chamado para o seguimento de Cristo à maneira de Francisco. Não se pode deixar a  chama morrer.  Através de constantes exames de nossa vida,  junto com os irmãos e as irmãs,  damos graças a Deus de nos ter chamado à vida franciscana e levamos a sério essa profissão, promessa de entrega ao Evangelho por meio de nossa profissão à qual seremos fiéis com, uma fidelidade dinâmica e criativa. Nossa profissão é feita para ser vivida no mundo. As tarefas de “sacristia” não são as prioritárias.

6. A OFS será expressiva e terá  visibilidade na medida em que seus irmãos viverem em fraternidades sólidas.  Os bispos, os padres, o mundo precisam dizer a nosso respeito:  “Vede como eles se amam!”  Sem romantismos de adolescentes sabemos que  viver em fraternidade é  desafiador. Levar a sério as reuniões que serão bem feitas, sem pressa, com gente que chega na hora, que fala, que participa, que vibra, que luta pela causa. Não apenas a justaposição de pessoas que estão ali por uma fria obrigação. Fraternidades que se exprimem no estar juntos, no acudir as necessidades dos irmãos de dentro e de fora. Fraternidades que se manifestam num  jeito de viver em que não se fala mal de ninguém, em que o outro não é um rival ou uma ameaça, onde não há competição tola, nem sede e fome de poder. Fraternidades corajosamente fraternas num mundo de individualismo. Fraternidades sempre em estado de construção.

7. Vivendo em fraternidades seculares, convivendo com os irmãos da Ordem Primeira e da TOR,  com as Irmãs Pobres de  São Damião, com as religiosas e religiosos que se vincularam ao carisma franciscano, os franciscanos são uma mesma família, a Família franciscana que precisa ser ‘ expressiva”.  Não é assim que uma diocese tome a decisão de  dispensar os frades quando ela dispõem de padres diocesanos para executar o trabalho que era feito pelos frades.  Os frades não são meros tarefeiros. Os franciscanos, de qualquer as três Ordens,  precisam constituir uma presença querida, desejada e quase necessária.  Na medida em que mostramos unidade no seio da Família ficará mais visível  o carisma e a “expressividade”. Precisamos urgentemente comemorar  juntos nossas festas e deixarmo-nos impregnar uns da força e da energia dos outros. Se não formos uma Família franciscana unida será difícil  mostrar “expressividade”.

8. Podemos dizer que há um  pequeno buquê de posturas ou convicções que nos identificam,  que nos tornam pessoas “simpáticas” no seio da Igreja e do mundo. Tais posturas  poderão ser nossa  “carta de identidade”:

  • Marca registrada dos franciscanos é a “descomplicação” e falta de  “solenidade pomposa”; em outras palavras, são pessoas que são o que são, não têm dobras, são  simples;
  • Os franciscanos não se cansam de contemplar a singeleza do presépio e o aniquilamento da cruz; por isso sua simplicidade se mistura com apreço pela pobreza. O casamento de um franciscano tem beleza simples e não pompa mundana, a casa de um franciscano é lugar de acolhida  e não espaço de ostentação;  o carro de um franciscano não precisa ser do último modelo, nem seu guarda roupa sempre da  moda…
  • Aqui e ali os franciscanos se mostram alegres, gostam de cantar, de decantar o sol, as estrelas… cantam uníssono, cantam a mais vozes; cantam em suas fraternidades. Cantando vão além da euforia nervosa e barulhenta.  São profundamente alegres, da alegria parecida com a perfeita alegria de que falava Francisco a Frei Leão.  Uma alegria pascal, que passa pelo êxodo de si, pela morte do homem velho.  Ou não dá para exprimir essa postura?
  • Vivendo em fraternidades os franciscanos são conhecidos como irmãos e irmãs;  Exprimem-se como irmãos de todos e de tudo.  Mas são irmãos menores.  Sem grandes pretensões.
  • Os franciscanos seculares, como o próprio Francisco, vivem um tensão entre  ação e contemplação. Não são pessoas que correm de um lado para o outro, sem nexo.  Mergulham sua vida na contemplação nas grutas, no silêncio, na interiorização. Os franciscanos seculares visitam seu interior.

9. O último  Capítulo Geral da Ordem  insistiu que a OFS coloca-se a família como uma de suas prioridades.  Os seculares são,  pois,  convidados a “exprimir-se” através de sua família.  Não poucas vezes há mulheres ou homens que pertencem  à OFS  e que não têm apoio dos seus.  Os parentes acham  que ele ou ela são piedosos e têm uma devoção por São Francisco e por isso  entraram na Ordem. Na verdade não entendem o que é a Ordem . Seria bom, quanto possível, que marido e mulher fossem franciscanos.  A partir daí haveria uma expressão conjugal franciscana.

10. O tema família e OFS é delicado e intrincado.  Chamamos atenção apenas para alguns tópicos que nos parecem importantes, na linha da  “expressividade”  franciscana da família.

  • Os franciscanos seculares valorizam o sacramento do matrimônio.  Escolhem padrinhos diferentes.  Os noivos se preparam espiritualmente para  cerimônia. Uma vez casados vivem  a espiritualidade conjugal com as conotações franciscanas: simplicidade,  pobreza digna,  respeito pela vida, educação dos filhos marcada pelo Evangelho.
  • Na medida do possível,  as famílias deveriam se fazer presentes mais vezes nas reuniões da Fraternidade.
  • Os franciscanos seculares  terão o hábito de festejar os aniversários de casamento.
  • Haverão de se dispor a trabalhar pela família antes do casamento, no momento de sua celebração e depois do casamento como agentes qualificados de uma pastoral evangélico-franciscana.

11. Há um testemunho do leigo  a ser dado no campo da política. Voltamos a citar  Christifideles Laici:  “Para animar cristãmente a ordem temporal, no sentido de que se disse de servir a pessoa e a sociedade, os fiéis leigos não podem absolutamente abdicar da participação  na “política”, ou seja, da múltipla e variada ação econômica, social, legislativa, administrativa e cultural, destinada a promover orgânica e institucionalmente o bem comum” (n.42).  Não haveria uma missão do conselho nacional e  dos conselhos regionais no sentido de refletir sobre graves problemas sociais e políticos:  a questão do tratamento médico, da corrupção, dos salários loucamente exagerados dos políticos?  Os leigos franciscanos não poderiam tomar decisões que “chocassem”?  Talvez não seja possível.

12. Evidentemente, os franciscanos seculares não se recusam a trabalhar na pastoral paroquial. Ao contrário, fazem questão de dar sua contribuição. Quando agem pastoralmente fazem-no a partir de sua identidade franciscana. Questionam uma pastoral meramente sacramentalista.  Sua ação se reveste do jeito franciscano. Os franciscanos seculares, no entanto, colocam prioridades a partir de sua profissão na OFS.

13. Para que a OFS  seja  expressiva, parece importante que nas fraternidades locais, regionais, e de modo especial na fraternidade nacional, se cuide da formação de lideranças  a partir de uma eclesiologia de comunhão e de uma concepção clara da índole secular da OFS.  Precisamos de líderes.  Reflexões e estudos de lideranças franciscanas seculares  ajudarão a tornar a OFS  expressiva.

Questões

1. Que ideia formam as pessoas a respeito  da OFS?  Que dizem dela os bispos, os sacerdotes, os leigos de sua paróquia ou comunidade?
2. Que expressão pública tem a sua fraternidade concreta?
3. O que chamou sua atenção neste texto de reflexão?
4. Seria viável a criação e formação de escola de lideranças?
5. Os frades e assistentes contam com a OFS como uma plêiade de leigos maduros e atuantes?  Eles acreditam na  OFS?
6. Em que sentido se diz que a assimilação da Regra dará maior expressão aos franciscanos seculares?

A OFS  não pode ser vista apenas como um grupo de pessoas piedosas, de  senhoras e senhores inofensivos e idosos.  Nossas fraternidades serão expressivas na linha de serem espaços onde vivem pessoas que professam o Evangelho como forma de vida e estão empenhados em restaurar a Igreja com seu gênero de vida.

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