sábado, 22 de setembro de 2012

É impossível viver sem o perdão!

 

A importância do perdão para a formação humana e espiritual

Perdoar: certamente não é fácil. Quem já precisou perdoar uma grave ofensa ou esqueceu uma mágoa importante, bem o sabe. Entretanto, é algo indispensável não apenas do ponto de vista cristão, mas também humano. Tanto que a revista Veja, em 2008, dedicou uma reportagem “de capa” a este tema. Entre tantas coisas, na introdução se lê: “A luta entre a sabedoria que leva à reconciliação e o desejo de retaliar é mais antiga que a civilização e continua sendo travada nos dias atuais. A lição da história é que foi através do perdão que a humanidade conseguiu interromper as espirais de violência provocadas pela vingança”.

 

Quero iniciar esta reflexão com uma constatação que é de alguma forma aceita por todos: sem perdão é impossível viver em sociedade ou em comunidade. Por quê? O fato é que no dia a dia da nossa existência somos cercados por situações, acontecimentos e pessoas pelos quais somos feridos, machucados e ofendidos. Pessoas que encontramos casualmente, colegas de trabalho, conhecidos e até mesmo aqueles que amamos (como nossos amigos e familiares) ‒ em algum ponto ou outro de nossa vida nos ferem e nos magoam. E por que isso acontece? As pessoas são más? De forma nenhuma! Pelo menos a grande maioria não o é. São simplesmente humanas. E devido às suas limitações são sujeitas a falhas. Perdoar é, portanto, uma exigência do conviver com outros seres humanos.

No entanto, o perdão não tem apenas uma conotação exterior ou social; tem também uma profunda conotação interior e pessoal. O perdão tem uma força capaz de reconstruir uma pessoa, assim como a falta dele é capaz de destroçá-la em sua interioridade. O perdão é um tema vasto e traz grandes implicações e ramificações, todas importantes. Entre elas, escolhemos “a importância do perdão para o crescimento humano e espiritual” como o tema desta reflexão.

Por “crescimento” quero indicar o processo de amadurecimento. Este, leva o ser humano, ao longo da vida, a superar a visão de mundo concentrada em si próprio. Libertando-o de um comportamento infantilizado para tornar-se cada vez mais maduro. O amadurecimento humano acontece ao longo de um processo de desenvolvimento que vai da infância, passa pela adolescência, para chegar à idade adulta, e daí por diante. Esse processo se compõe de vários elementos físicos, afetivos, intelectuais e morais, os quais se desenvolvem mais ou menos paralelamente. Ao se dizer “processo”, quero dizer que não é uma realidade estática, mas sempre em movimento e nunca é perfeitamente acabado.

A maturidade espiritual é também um processo. Pressupõe o amadurecimento humano e, além disso, também passa por vários estágios. Podemos encontrar vários ecos desta verdade na palavra de Deus. Como, por exemplo, nestas palavras de S. Paulo: “A vós, irmãos, não vos pude falar como a homens espirituais, mas como a carnais, como a criancinhas em Cristo. Eu vos dei leite a beber, e não alimento sólido que ainda não podíeis suportar” (ICor 3, 1-2).

A diferença fundamental entre um e outro é que o amadurecimento espiritual é uma realidade que vai além do processo humano. Enquanto que no amadurecimento humano a finalidade é o desenvolvimento dos dotes naturais os quais nos tornam capazes de lidar com as situações próprias de cada época de nossa vida. A finalidade do amadurecimento espiritual é infinitamente mais ampla e mais profunda. A meta do amadurecimento espiritual é atingir a plenitude do “sonho de Deus” para cada pessoa humana. É, como diz S. Paulo, “atingir o estado de homem perfeito, a estatura da maturidade de Cristo” (Ef 4, 13). Ou ainda, conduzir a pessoa a ter em si “os mesmos sentimentos que tinha Jesus Cristo” (Fl 2,5).

Os dois processos são conectados um ao outro, mas não são automáticos. Cada pessoa pode interferir positiva ou negativamente no seu desenvolvimento pessoal. Com suas decisões e seus esforços, a pessoa pode acelerar o amadurecimento, retardá-lo ou mesmo interrompê-lo. Vários são as atitudes humanas que contribuem ou atrapalham o processo de desenvolvimento humano e espiritual. A capacidade de perdoar é um daqueles elementos que interferem profundamente. Vejamos como:

O perdão é, em primeiro lugar, um ato de verdadeiro amor a si próprio, que é uma das condições indispensáveis para se viver uma autoestima saudável. Quando tomo a decisão de perdoar um mal que me foi feito, o primeiro beneficiado com o perdão sou eu mesmo. A mágoa, o rancor, o ressentimento são sentimentos que fazem mal à pessoa que os carrega. Fazem mal porque é como carregar uma fonte de amargura e infelicidade para qualquer lugar que se vá. O Escritor S. Covey descreve essa atitude com a expressão: “dormir com o inimigo”[2]. Significa: levar para dormir conosco em nosso coração, em nossa mente uma pessoa ou uma situação que nos fez mal. Infelizmente tantas vezes carregamos “o inimigo” não apenas para a cama, mas também ao cinema, ao restaurante, às férias e mesmo à igreja. Portamos em nosso coração e mente algo ou alguém que não está presente fisicamente, mas que continua a nos fazer mal. Porém, quando perdôo, é o meu coração e a minha mente que ficam livres da amargura.

Outro aspecto considerável é que a falta de perdão é uma espécie de “emotiva máquina do tempo” que mantém a pessoa presa ao passado. Quem não perdoa vive emotivamente “encarcerada” em algum ponto de sua história. Não consegue ir em frente, avançar, crescer como pessoa. Não é incomum ver pessoas com grande potencial humano (inteligência, instrução, etc.) que, no entanto, são incapazes de progredir como outros até menos dotados.[3] Uma das razões é a incapacidade de perdoar que faz com que essas pessoas vivam mergulhadas em seus ressentimentos e suas mágoas. Não conseguem avançar para um novo estágio da sua vida. Permanecem estacionadas no passado. Algumas vezes são fatos acontecidos há pouco tempo; outras, são fatos acontecidos na infância, mas que continuam presentes na memória afetiva. Enquanto uma pessoa não decide perdoar vive no passado, continuamente experimentando uma amargura retroativa. Não importa se foi ontem ou há 20 anos aquilo que a feriu: é sempre passado. Contudo, a realização e o amadurecimento estão no presente e no futuro.

Um último elemento, não menos importante, vem do fato de sermos cristãos o que, portanto, quer dizer: imitadores de Cristo. O perdão é exigência essencial do cristão. Devemos olhar para o próprio Jesus que nos ensinou por suas palavras e atos. Não se pode considerar como um cristão aquele que rejeita perdoar, ou que não faz um esforço para colocá-lo em prática. A palavra de Jesus é tão clara que não há nem mesmo necessidade de se dizer tanta coisa. Repito aquilo que S. Paulo nos diz: “(...) não continuemos crianças ao sabor das ondas... ao capricho da malignidade humana” (Ef 4, 14).

Devemos aprender a perer, a peroar e a esquecer todo o mail que sofremos - o que conseguimos com a ajudada da graça de Deus.

Pe. Jair Batista de Sousa, MIC

Fonte: Portal da Divina Misericórdia

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